Equalização entre os modais facilitaria projeto do governador de privatização do trem e do metrô, segundo a oposição
Vencida a eleição em São Paulo, o prefeito Ricardo Nunes (MDB) terá de enfrentar um desafio — e uma possível crise — nos dois primeiros meses da nova gestão municipal. Assunto delicado na capital paulista, o reajuste do preço das passagens de ônibus — congelado há quatro anos em R$ 4,40 — está em debate mais uma vez. Após sinalizar durante a campanha que não mexeria no valor neste ano, o prefeito reeleito acenou com um possível aumento na última segunda-feira.
Na Câmara de Vereadores, o novo posicionamento foi visto como um dos primeiros sinais da influência do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos), principal cabo eleitoral de Nunes na campanha à reeleição.
No início deste ano, o governador decidiu aumentar a tarifa do trem e do metrô, gerenciados pelo estado, para R$ 5. Nunes, em ano eleitoral, optou pela manutenção dos ônibus, concessão municipal, em R$ 4,40. Na avaliação da oposição, a equalização da tarifa entre os modais, além de trazer um respiro para os cofres municipais, também facilita o projeto de Tarcísio de privatização do transporte sobre trilhos.
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“Se a tarifa do metrô fica desalinhada com a dos ônibus, ocorre uma migração de passageiros de um modal para o outro. O Tarcísio precisa equacionar isso para dar tranquilidade para o concessionário privado que vier a assumir a operação de linhas no futuro”, afirmou em caráter reservado um vereador da oposição.
Na capital paulista, como em outras cidades brasileiras, o custo de operação do sistema de transporte é dividido entre poder público e os usuários. Para manter o valor da passagem em um patamar “saudável” para a população, a prefeitura transfere um montante para as empresas, de modo a abater os gastos: em 2024, até o mês de setembro, foram empenhados R$ 5 bilhões. O ano passado já havia atingido um recorde histórico, com R$ 5,3 bilhões. Em 2025, a previsão é de que a administração municipal destine R$ 6,5 bilhões às companhias por meio desses subsídios.
GRATUIDADES
Durante a campanha, Nunes prometeu ainda mais gratuidades no ônibus, como para as mães inscritas no CadÚnico com crianças em creches municipais, o que pode elevar o valor gasto anualmente.
Dados da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU) apontam que, no país, 370 prefeituras adotam subsídios para o modal, tirando dos cofres públicos, em média, 31% do custo total do transporte. Em São Paulo, o índice chega a 47%.
— Quando se pega o custo e divide pelo número de passageiros, é um valor insuportável para o cidadão pagar. Defendemos o subsídio — diz o diretor executivo da NTU, Francisco Christovam.
Em nota, a prefeitura de São Paulo, por meio da SPTrans, afirma que a manutenção de uma “tarifa acessível, a integração gratuita entre ônibus, o desconto na integração com o sistema de trilhos e a gratuidade a idosos, estudantes e pessoas com deficiência são garantidas” pelo subsídio. Sem ele “o valor da tarifa seria de R$ 11,62”, diz.
Segundo dados do Laboratório Arq.Futuro de Cidades do Insper, os maiores custos do transporte são o custeio de mão de obra, com 42%, e o combustível, com 28%.
Outros especialistas defendem que a melhor forma de equilibrar as contas e evitar a atual escalada nos subsídios é a revisão dos contratos. Para eles, a prefeitura não sabe com clareza quanto as empresas gastam para manter o transporte de ônibus. Além disso, criticam a adoção da quantidade de passageiros transportada como fator de peso no cálculo do valor a ser pago para as companhias.
Mauro Zilbovicius, professor da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli-USP), classifica como “absurda” a conta adotada pelo poder municipal, que divide o valor do sistema por passageiro, chegando aos citados R$ 11,62, e defende que a conta correta deveria considerar o quanto a empresa gasta para rodar por quilômetro:
— Imagine o seguinte: você pega um carro de aplicativo e a viagem dá R$ 30. Se você entrar com um amigo, com a esposa, vão cobrar R$ 30 de cada um? Não. Não se cobra por passageiro, e sim pelo valor do trajeto. O melhor que o prefeito pode fazer é mudar os contratos para um modelo que adote o real custo de operação, mais uma taxa de lucro.
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Em nota, a prefeitura afirma que as concessionárias são remuneradas de acordo com uma fórmula que considera”"não somente os passageiros transportados, mas o custo operacional, ou seja, cumprimento da frota programada, as horas de operação e a quilometragem, a demanda, além dos custos fixos do veículo”.
Fonte: O Globo