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15/02/2020

Efeito Espectador: como nós reagimos diante de um crime?

Foto: Divulgação

As sugestões apontaram que 70% das pessoas ajudariam, por exemplo, uma mulher em situação de perigo

Qual seria a sua imediata reação se presenciasse um crime ou situação de extrema urgência? Mas e se fosse você e mais 10 outras pessoas, ainda assim manteria a mesma atitude ou seria um pouco desencorajado?

 

Numa análise ao longo dos anos, as estatísticas acerca desse tipo de comportamento que envolve aspectos emocionais, disposicionais e motivacionais, se mostraram instáveis, principalmente com a evolução da tecnologia.

 

Numa pesquisa realizada pela Economic and Social Reserach Council (ESRC), as sugestões apontaram que 70% das pessoas ajudariam, por exemplo, uma mulher em situação de perigo, se fossem as únicas testemunhas. No entanto, esse número caiu para 40% se outras pessoas também estivessem no mesmo cenário.

 

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Em 1964, depois do que aconteceu com Kitty Genovese, os psicólogos Bibb Latané e John Darley passaram a chamar isso de Efeito Espectador ou Apatia Social, um estudo que define que as pessoas estão menos inclinadas a ajudarem as outras quando não são as únicas testemunhas em um momento de extrema necessidade.

 

Há 56 anos, a jovem Kitty estampava as manches do The New York Times.

 

A vítima do efeito

 


Kitty Genovese nasceu Catherine Susan Genovese no dia 7 de julho de 1935, no Brooklyn, na cidade de Nova York. A filha primogênita de Vincent Andronelle Genovese e Rachel Genovese era descendente de italianos e morava no Park Slope, um dos bairros responsáveis por mais acolher famílias irlandesas e italianas na época.

 

Ao lado de mais quatro irmãs, Kitty era tida como uma mente brilhante, promissora e esforçada que dedicava todo o seu tempo aos estudos desde que era só uma garotinha. Durante a adolescência, em 1954, sua mãe testemunhou um assassinato em frente à sua casa e a família decidiu se mudar para New Canaan, em Connecticut, para que ela pudesse se estabilizar emocionalmente e se sentir mais segura. Kitty, no entanto, ficou para trás aos cuidados dos avós para que pudesse concluir o ensino médio na antiga Girls Commercial High School.

 

Kitty Genovese chegou a ser noiva, porém nunca se sentiu confortável com a sua orientação sexual. No ano de sua formatura, o seu casamento foi cancelado e ela decidiu se mudar para um condomínio de apartamentos ainda no Brooklyn, enquanto fazia trabalhos administrativos.

 

À essa altura, no entanto, a cabeça da garota já havia mudado bastante com relação àquela Kitty que queria ser tão grande quantos os pais esperavam. Por isso, ela decidiu largar tudo para se tornar bartender numa casa noturna chamada Eleventh Hour Bar, no Queens.

 

Alguns meses mais tarde, a sua eficiência a levou a ocupar o cargo de gerente do bar. Ela começou a ganhar bem, mais do que acreditava que poderia, e tudo o que fazia era depositar boa parte da quantia numa poupança para que conseguisse realizar o seu sonho: abrir um restaurante italiano.

 

No dia 13 de março de 1963, Kitty conheceu Mary Ann Zielonko numa balada no Greenwich Village, com quem rapidamente se apaixonou. No mesmo ano, Mary deu a ideia de as duas morarem juntas, então elas alugaram um apartamento que ficava próximo à estação de trem Long Island Rail Road, no Queens.

 

O apartamento ficava no segundo andar de um prédio de 14 níveis situado em cima de uma loja, num típico estilo suburbano nova-iorquino. Era um local seguro e considerado pacífico pela maioria das pessoas que lá viviam.

 

A apatia do efeito

 


No sábado do dia 13 de março, às 2h30, Kitty Genovese estava voltando para a casa depois de uma noite intensa de trabalho. Às voltas com o volante do carro, ela dirigia pelas vias largas das ruas que serpeiam o bairro do Queens onde a neve se empoçava nas esquinas e brilhava sob a luz fraca dos postes, prestes a começar a derreter naqueles últimos dias de inverno de 1964.

 

Apesar do cansaço, Kitty estava feliz e até mesmo enérgica. O único pensamento que tinha em mente era chegar logo em casa para poder comemorar com Mary o aniversário de namoro delas.

 

Kitty estacionou na estação de trem vizinha ao seu prédio e seguiu a pé até a entrada dele que ficava a 30 metros de distância, na esquina de um beco. A mulher não sabia, porém, que Winston Moseley a espreitava de seu carro.

 

O homem de 28 anos de idade, de aparência comum e despretensiosa, trabalhava para uma empresa de máquinas de negócios, havia deixado a sua esposa e mais dois filhos em sua casa em South Ozone Park, também no Queens, para procurar uma vítima para a faca de caça que tinha no bolso do casaco e para o desejo sexual pervertido e doentio, criminoso, que não se aguentava em suas calças. Ele estava às voltas pelas ruas do bairro desde a 1h da manhã e estava quase desistindo quando viu a mulher manobrar o Fiat vermelho.

 


Kitty ouviu passos pesados esmagarem a neve junto aos seus, então decidiu começar a correr pela rua desolada. Winston a alcançou mais rápido do que ela esperava e não hesitou em golpeá-la duas vezes nas costas. Kitty caiu e começou a gritar que tinha sido esfaqueada, quebrando o silêncio modorrento entre as construções de tijolos aparentes. Robert Mozer, um vizinho, saiu à janela de seu apartamento e gritou: “Deixe a garota em paz!”. Intimidado, Winston voltou para o seu carro e fugiu.

 

Ferida, Kitty ficou de pé e se arrastou até o hall de entrada do prédio, mas desabou no chão novamente. Naquele momento, várias pessoas já haviam saído às janelas de suas casas para checar o que estava acontecendo, enquanto Kitty gania de dor.

 

Dez minutos depois, Winston voltou, de acordo com testemunhas. Dessa vez, protegendo o rosto com um chapéu, ele vasculhou o estacionamento e a estação de trem até encontrar Kitty caída, quase inconsciente. Ele então a estuprou por um período de meia hora e depois disso distribuiu 17 facadas nela, antes de roubar U$45 dólares e fugir de novo.

 

Só por volta das 3h50 que alguém decidiu ligar para a polícia. Antes disso, essa testemunha teria ligado para uma amiga, Sophia Farrar, uma vizinha. Foi ela quem encontrou Kitty Genovese numa poça do próprio sangue. A ambulância demorou vários minutos para chegar e a mulher morreu a caminho do hospital devido ao sangramento ininterrupto.

 

Os gritos no silêncio


“Eu estava cansado e voltei para a cama”, “achei que era algo de casal”, “eu não gosto de me envolver”, “não liguei para a polícia porque achei que alguém já havia feito isso”. Essas foram só algumas das declarações dos vizinhos que testemunharam o ataque e preferiram a omissão do que a ação, ainda que essa fosse apenas pegar o telefone e discar o número da polícia na segurança de seu lar.

 

Fotos: Reprodução

 

Karl Ross, por exemplo, foi um dos que ligou para um amigo pedindo conselho sobre o que fazer. Ele não ligou para a polícia, tampouco o amigo. Mas o telefone sem fio continuou. O segundo amigo, que não reportou às autoridades, ligou para um terceiro amigo, que só então resolveu ligar para a polícia, sendo que sequer morava no mesmo bairro do crime.

 

O sistema 911 para emergências não havia sido criado naquela época e a polícia inclusive ignorou o pai de uma das testemunhas, mesmo depois de esse dizer que uma mulher havia sido espancada na rua. Eles não deram prioridade a nenhuma das ligações até a de Sophia Farrar.

 

Uma semana após o ataque e com os detetives John Carroll e Jerry Burns focando mais em Mary e as atividades sexuais delas como um casal do que qualquer outra coisa, Winston Moseley foi preso após um assalto. Ele acabou confessando o assassinato de Annie Mae Johnson, Barbara Kralik e também de Kitty Genovese.

 

No dia 15 de junho de 1964, ele foi julgado e sentenciado à morte, mas teve a pena reduzida para 20 anos. Chegou a fugir da prisão em 1968 e recebeu mais 30 anos de encarceramento. Em 28 de março de 2016, ele morreu em sua cela, aos 81 anos de idade, como um dos presos mais antigos do sistema carcerário de Nova York.

 

A revista The New York Times com a matéria de capa de Martin Gansberg sobre o assassinato de Kitty, ainda que de maneira tendenciosa e com fatos exagerados, repercurtiu o caso para todos os cantos.

 

O Efeito Espectador também virou A Síndrome de Genovese para os dois psicólogos fundadores do estudo, que foi engrossado pela psicologia comportamental acerca da relutância das pessoas em oferecer ajuda, num aumento da autopreservação e diminuição da empatia. Nos dias de hoje, esse efeito foi distribuído para a necessidade das pessoas em documentar tudo com os seus smartphones e postar nas redes, do que usá-los para chamar a polícia.

 

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Kitty Genovese se tornou uma espécie de parábola, mostrando o lado obscuro do cotidiano e o protagonismo perturbador de sua breve história serviu para a criação de leis samaritanas, implementação de um sistema de emergência e estudos científicos. Mas, por mais repercussão que teve, talvez não tenha sido eficiente em educar o mínimo nas pessoas: humanidade.

 

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