"O meu nome é Camila Paiva, tenho 40 anos e sou a primeira mulher oficial do Corpo de Bombeiros de Alagoas. Eu passei no concurso de oficial do Corpo de Bombeiros Militar de Alagoas em 2002, primeiro ano em que a mulher pôde fazer o concurso para oficial. Eu tinha apenas 19 anos quando fiz o concurso e passei como primeira colocada.
Essa questão trouxe vários desafios porque, apesar de o meu pai, que era bombeiro, ter me incentivado, eu não tinha ideia do que era a vida militar. Eu precisava ser o espelho da minha turma e fazer todas as atividades, tive que me tornar uma referência e a cada dia eu estava me superando, para mostrar que eu era capaz e merecia estar ali, pelo simples fato de eu ser mulher.
Sempre percebia um certo questionamento do tipo “será que ela vai conseguir?” ou “será que ela vai ter coragem?”, aquelas brincadeiras e piadinhas. E na época eu nem entendia, porque não se discutia essa questão do machismo. O que mais me marcou foi quando eu cheguei na academia e tive que ouvir de uma colega: “Camila, com esse seu jeito não dá pra você ser militar”. Eu fiquei sem entender e perguntei o porquê, e ela disse: “Porque mulher no quartel ou é p*ta ou é sapatão”.
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Na época eu não percebi que isso era uma violência, porque eu era simplesmente eu e não deveria ser obrigada a escolher entre um ou outro. Antes disso, não existia mulher fazendo curso de oficial, as instituições militares foram criadas pelos homens e para os homens, assim como esses estereótipos, que foram criados por eles, e eu achei que deveria me adaptar.
Com isso, eu comecei a mudar o meu jeito, porque eu sempre fui uma pessoa muito extrovertida, sorridente e fazia várias amizades. Achei que eu não seria respeitada como profissional ou não teria a minha autoridade reconhecida se eu fosse desse jeito. Isso resultou em uma depressão profunda anos depois, eu me culpava e me sentia ingrata por não estar feliz com o que conquistei. Depois eu fui entendendo o peso do machismo e da imposição de padrões para as mulheres, e as consequências disso, o que passou a ser meu trabalho também.
Fotos:Reprodução
Comecei a fazer palestras sobre empoderamento feminino e diversos assuntos em vários estados do Brasil. Em 2021, fui convidada para assumir a presidência da Comissão Mulher Segura, que trabalha em políticas de prevenção à violência contra a mulher no estado de Alagoas, desenvolvendo plano de enfrentamento e de capacitação de agentes de segurança pública para um atendimento humanizado às mulheres em situação de violência.
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Criamos um movimento chamado “Somos Todas Marias”, quando apresentei questões de assédio sexual dentro das instituições de segurança pública e começamos um desafio, pedindo que as mulheres contassem suas histórias e os assédios que enfrentaram. Todas as violências que sofri me motivaram a seguir em frente e ser a voz das mulheres que não poderiam ter suas vozes ecoadas, por ocupar posições menores".
Fonte: Terra